sexta-feira, outubro 31, 2003

A minha tia

Hoje é dia de Halloween. Foi o que deduzi logo depois de ter tido a visita da minha tia ribatejana logo às dez horas da manhã. Bom, não posso dizer mal dela porque recebi como presente um pijama - fiquei tão contente que só o vou tirar para ir para a cama. A minha tia é muito alta, tão alta que quando come um iogurte chega à barriga fora de validade – mas o que me enerva nela é que leva uma vida muito diferente do resto da família: muito agitada. Tenho a certeza de que se ela fosse uma vaca, em vez de dar leite, dava manteiga.
De vez em quando, ela aparece e eu sinto que tenho a obrigação de lhe dar atenção. Ela já tem uma certa idade e a mãe, uma famosa tenor, morreu há pouco tempo – era tão velha que nos últimos tempos teve de formar um trio: ela cantava e as outras duas amparavam-na.
O pior é que a minha saudável tia é uma hipocondríaca paranóica. Hoje estava toda contente porque o médico lhe tinha dado uma boa notícia: a doença dela ia ter o seu nome. Coitada da minha tia: para ela, a vida é uma doença sexualmente transmissível. Sim, para a aturar é preciso ter paciência – e tê-la é muito complicado, requer anos de treino monástico ou dizer-se uma palavra secreta antes de dormir. Qual? Amanhã digo...

quarta-feira, outubro 29, 2003

- Estou a cagar-me para a justiça!


Hoje acordei sobressaltado com a campainha da porta. Era o meu primo, que queria ir à casa de banho e, como não havia papel higiénico, pediu-me um jornal. Peguei num diário que tinha como destaque as palavras de um político:
- Estou a cagar-me para a justiça!

Sentei-me à frente da televisão, mas não tinha o comando por perto. Procurei pela sala inteira o raio do comando e, como sou teimoso, recusei-me a mudar de canal manualmente. Fiquei a ver “O juiz decide” e, a cada minuto, murmurei:
- Estou a cagar-me para a justiça!

A meio da tarde decidi que não ia trabalhar, porque neste país posso meter baixa quando e como quiser. Eu sei que não é justo, mas...
- Estou a cagar-me para a justiça!

À noite, entrei no meu Porsche e acelerei até à discoteca mais próxima. Um polícia mandou-me parar e, antes que ele pudesse dizer alguma coisa, gritei-lhe:
- Estou a cagar-me para a justiça!

Consegui chegar ao meu destino, apesar de ter tido que recompensar o PSP. E para entrar na discoteca tive que fazer o mesmo ao segurança. Os cromos que estavam na fila insultaram-me, mas eu trocei:
- Estou a cagar-me para a justiça!

De repente, apareceu uma mulher linda (daquelas que só vemos no canal Playboy) com um vestido com menos tecido que a minha gravata. Ela olhou para as outras mulheres, aproximou-se de mim e disse:
- Estou a cagar-me para a justiça!

Chegamos a minha causa poucos minutos depois e passados alguns segundos estávamos despidos. Fiquei extasiado a ver aquele corpo monumental à minha frente, mas quando ela percebeu que eu não tinha preservativo, despediu-se e segredou-me ao ouvido:
- Estou a cagar-me para a justiça!

É por esta e por outras que, quando me encontrar com Deus no “Dia do juízo final”, lhe vou dizer na cara:
- Estou a cagar-me para a justiça!